Ela
não dormira aquela noite. Os toques que recebera dele em seu sonho pareciam
reais demais para serem simplesmente esquecidos. Ainda podia sentir as pequenas
e suaves mordidas que ele distribuía em seu pescoço, assim como os beijos. Se
sentiu aquecida e estranhamente confortável ao lembrar-se dele. A única coisa
que ainda a chateava era o fato de não ter conseguido olhar com mais
profundidade o rosto do invasor. Havia focado toda sua atenção ora na situação
que se encontrava no sonho, ora nos olhos do suposto invasor.
Balançou a cabeça, tentando deixar aqueles pensamentos e flashes para trás. Foi até seu banheiro
escovar os dentes. Olhou-se no espelho, as olheiras estavam profundas e bem
marcadas, seria difícil disfarçá-las no estado em que as mesmas se encontravam.
Sua pele se encontrava pálida, devido à noite mal dormida. Passou suas mãos
pelo rosto descendo ao pescoço e para sua surpresa: havia marcas vermelhas em
seu pescoço, no mesmo lugar em que o invasor havia beijado no sonho.
Lissy...
Em um sussurro seu nome era chamado, vinha do lugar de
sua cama. Ao se virar para a mesma e ver quem a chamava, viu um homem, vestido
exatamente igual ao invasor de seu sonho. Estava de pé, ao lado de sua cama, a
olhando com os olhos amarelos. Foi o tempo de ela piscar e o homem desaparecer.
Lissy fica encarando o lugar e quando voltou a olhar para dentro do banheiro, o
homem ressurge em sua frente. Tamanho foi o susto que Lissy cai, batendo a
cabeça na porta do banheiro.
Ele some novamente.
- Lissy, você está
bem querida? – Diz Sra. Summers do lado de fora do quarto, mas não obteve
respostas. Lissy tentava se recompor do susto que tomara. – Lissy?
- Estou bem, mãe! – Lissy responde finalmente, olhando-se
no espelho. – Estava com espuma na boca, me desculpe!
- Tudo bem, quando
terminar aí desça pra cozinha, Bianca passou aqui e lhe deixou um recado!
- Pode deixar! – Respondeu Lissy, olhando preocupadamente
ao seu reflexo no espelho.
As manchas haviam sumido.
-
- -
- Ele está fora de si,
Martha! Temos que eliminá-lo logo! – Diz Joseph, andando de um lado para o
outro. – Ele pode ser um risco não apenas à nós, mas também ao circo! Já pensou
em como seremos crucificados, caso os ignorantes dessa cidade descobrirem que a
“nossa besta” fugiu? Ou o que ele realmente é? Seremos caçados! A base de
lanças e tochas!
- Não irei matar aquele que garante que eu tome um
belíssimo, saboroso e original Rioja 1925 (n/a:
vinho). – Diz Martha, uma mulher já na casa dos 45/50 anos, essa tinha os
cabelos louros e os olhos azuis, quase cinzas. Sua pele, claro, estava gasta,
graças à sua idade. Estava sentada num sofá-cama vermelho. Vestia um vestido
que lembrava os grandes e elegantes vestidos medievais e brincos de pérolas
extremamente brancas enfeitavam suas orelhas. – Se acalme, querido Joseph,
ninguém descobrirá o nosso pequeno e valioso segredo.
- Quem garante? – Joseph cruzara os braços, olhando sério
para Martha.
- Ora, ele mesmo... – Ela respondeu, levantando-se do
sofá-cama. – Ele sabe o que acontecerá se descobrirem sobre ele. Acha mesmo que
nossa valiosa besta irá se arriscar? Ainda mais por uma garotinha? Até parece
que não são colegas de infância, Joseph.
- Não sabe do que ele é capaz! Eu o vi assassinar os
próprios pais, apenas para saciar sua sede! Não duvido que o próprio mate toda
a cidade, e claro, começará por nós! – Joseph bufa, odiava discutir com aquela
mulher, sempre perdia as brigas.
Martha abraça Joseph por trás, acariciando seu tórax e
ombros. Ele abaixa a cabeça para o lado, suspirando longamente. Martha
distribui alguns beijos no ombro do rapaz.
- Não há nada do que temer, Joseph... – Sussurra Martha
ao pé do ouvido do jovem. – Essas pessoas estão sendo enganadas, e nem ao menos
se dão conta disso. Uma morte ou outra não irá fazer diferenças, afinal,
pessoas morrem, não há nada mais natural do que isso. Pra que serve encher a
cabeça de falsas preocupações?
- Não estou verdadeiramente preocupado com as pessoas
daqui, sabe disso... – Ele se vira, ficando na frente de Martha. Pôs suas mãos
na cintura dela e ela, quase automaticamente, pôs seus braços ao redor do
pescoço de Joseph.
- Hm. Sei, sei muito bem. – Ela deposita um beijo nos
lábios de Joseph. – E peço que não se preocupe comigo, sei me cuidar.
Joseph sorri e aproxima o rosto, na esperança de
conseguir mais um beijo, mas Martha se afasta, dando um leve tapa na bunda do
rapaz.
- Agora, – Disse ela voltando a se sentar no sofá-cama. –
Certifique-se de que todos estarão dignos de se apresentarem essa noite, quero
que todas aquelas aberrações estejam impecáveis no espetáculo de hoje à noite.
E mande Harry alimentar a besta, sim?
- Como quiser, madame. – Joseph antes de sair, caminha
até Martha para depositar um beijo em sua mão.
Finalmente só, Martha resmunga:
- Pobre coitado...
-
- -
Harry puxava um carrinho com dois grandes barris em cima.
Deixava um rastro de sangue pelo caminho, esse sangue saia dos barris. Suava aos muitos, por causa da força que
fazia para puxar o bendito carrinho e por causa do clima extremamente quente do
dia, e para piorar a situação, a cela da besta era a mais longe, mais afastada
e a mais quente de todas as outras.
Ele enxuga a testa com as costas de sua mão, essa coberta
por uma luva preta, a fim de esconder sua aberração. Quando finalmente chega à
cela, bate na porta, para avisar quem poderia ser e não acabar assustando a
besta.
- Iae, cara? – Disse abrindo a porta da grande cela. –
Parece que querem ver você bem gordo hoje! – Harry ri da própria piada. – Já
viu o tanto de comida que mandaram hoje? Nem eu ganho tudo isso...
A besta levanta o rosto, olhando fixamente aos olhos de
Harry.
- Uia! Me desculpe, eu esqueci da porta! Aguente só mais
um pouco, okay? Vou trazer o outro barril! – Se desculpa Harry.
Como foi dito, o garoto traz consigo – e com muito
esforço – o segundo grande barril, fechando a maior porta primeiro e abrindo
uma pequenininha, localizada na parte inferior da grande.
- Um dia terei que enfiar na minha cabeça que você não
pode tomar luz do sol... – Ele se senta em algum canto da cela. – O que foi?
‘Tá calado hoje...
- Não estou com fome... – Responde, enfim, a besta.
- Ah! Qual é, Zayn? Não vai me fazer sentir que trouxe
esses dois barris pra cá à toa, vai? – Harry cruza os braços, indignado com a
resposta do amigo.
- É só levá-los de volta... – Zayn se mexe um pouco,
estava com os dois braços acorrentados em uma posição em que os dois se
cruzavam.
- Acha que é fácil? Diferentemente de você, eu não tenho
“superpoderes”! Pode comer esses troços e agora!
- E quem disse que eu tenho superpoderes? – Zayn ri
fraco.
- E você não tem
não? – Zayn nega com a cabeça. – Ué...
- Apenas posso controlar as mentes das pessoas... – Zayn
sorri mais largamente.
- E isso não é superpoder? – Harry se levanta e caminha
em direção aos barris.
- Não... É uma habilidade, apenas...
- Sei... Hm! – Harry destampa um dos barris, nele
continha órgãos de animais encontrados soltos pelas redondezas. – Tem certeza
que não vai comer?
- Absoluta, já me alimentei hoje e sinceramente, estou
cansado de comer fígado de gatos de rua.
- Então quer dizer que conseguiu sair daqui? – Harry
fecha novamente o barril, decepcionado de ter que levar os dois de volta pra
grande tenda.
- É... Pode se dizer que sim...
- E foi você quem matou aquele garoto duas noites atrás?
Zayn faz um breve silêncio.
- Talvez...
- Qual é, cara? Ficou doido? Martha está puta por causa
disso, capaz de descontar toda sua raiva no primeiro infeliz que aparecer em
sua frente!
- Tem medo da Martha?
- Não só tenho como também não sou doido de desafiá-la! –
Harry olhava para Zayn, deixando mostrar a preocupação que sentia em pensar em
Martha e nas outras aberrações.
- Olha quer saber? Por que não volta pra grande tenda?
Devem estar sentindo sua falta por lá e eu quero ficar sozinho... – Zayn abaixa
a cabeça. – Se quiser, pode deixar os barris aqui, não vou me sentir
incomodado.
- Beleza, mas prometa que não vai fazer alguma loucura
que possa colocar as pessoas desse circo aqui em perigo, okay? – Harry encosta
uma das mãos na porta da cela, prestes a abri-la.
Zayn nada responde. Harry respira fundo e murmura um “Você não tem jeito”, saindo logo em
seguida. Zayn encara a porta ser fechada e a encara por alguns minutos, até que
sai de seu breve transe e respira fundo, precisa voltar ao trabalho.
Antes que seja
tarde demais...